A aguardente é atualmente o produto derivado do medronho mais conhecido e valorizado. No concelho da Sertã, a produção desta bebida é uma tradição antiga. No passado, a produção de aguardente de medronho era uma atividade comunitária, onde várias famílias se juntavam para destilar grandes quantidades. A produção de aguardente de medronho, que envolve a colheita dos frutos maduros, a fermentação em barricas e a destilação em alambique, é uma prática que tem sido passada de geração em geração, mantendo viva a ligação das pessoas à terra e aos seus recursos naturais.
O alambique de cobre é um elemento crucial neste processo, onde se controla rigorosamente a temperatura e a quantidade de lenha utilizada para garantir uma destilação eficiente e de alta qualidade.
José Simão, um dos produtores locais, descreve detalhadamente as diferentes etapas do processo de produção da aguardente de medronho:
A colheita do medronho
O processo de produção começa com a colheita dos medronhos, que amadurecem ao longo de um ano. Segundo José Simão, o medronho deve ser apanhado quando está maduro, geralmente no outono, quando os frutos atingem a sua maturidade, apresentando uma cor vermelha intensa. Após a colheita, os frutos são colocados em barricas, onde se adiciona água. A quantidade de água depende das condições meteorológicas: se os frutos estiverem secos, é necessário adicionar mais, se estiverem húmidos, menos. A barrica é então fechada para que o medronho fermente naturalmente durante algumas semanas. Este processo é crucial, pois é ele que vai determinar a qualidade final da aguardente.
Fermentação
É no período de fermentação que o açúcar presente no fruto se transforma em álcool. Uma vez terminado este processo, o medronho fermentado é transferido para o alambique, o equipamento utilizado para a destilação. João Pires explica que antes de iniciar a destilação, o alambique é cuidadosamente lavado com água e sumo de limão, que ajuda a limpar o cobre e a garantir que o equipamento está em ótimas condições de higiene.
Destilação
O alambique, composto por uma panela de cobre, é então aquecido com lenha, preferencialmente de medronheiro ou torga, que queima lentamente e emite pouco fumo. O medronho fermentado é aquecido dentro do alambique até atingir uma temperatura quase de ebulição, mas sem ferver completamente. Durante o aquecimento, é necessário mexer a massa com uma colher de pau e uma raspadeira de cobre, para evitar que a mistura se agarre ao fundo.
Quando a mistura atinge a temperatura adequada, o vapor alcoólico sobe pelo alambique, passando por uma serpentina de cobre imersa em água fria. Esta serpentina é constantemente refrescada com água corrente para garantir que o vapor se condensa em líquido. O resultado é a aguardente de medronho, que começa a sair pela bica do alambique.
A "cabeça" da aguardente
A primeira fração da aguardente, chamada "cabeça", contém metanol, uma substância tóxica que deve ser descartada. Esta parte do processo não era praticada antigamente, mas atualmente, com base em análises científicas, sabe-se que o metanol é prejudicial à saúde, pelo que é removido. Normalmente, José Simão retira cerca de meio litro desta aguardente inicial antes de começar a recolher a aguardente boa para consumo.
Graduação alcoólica
Após a separação da "cabeça", a aguardente continua a sair, e é monitorizada para controlar a sua graduação alcoólica. No início, a aguardente pode ter cerca de 67 graus de álcool, mas à medida que o processo avança, esta graduação vai baixando. A aguardente é considerada de boa qualidade quando atinge uma média de 46 a 48 graus de álcool e um sabor característico que reflete as notas frutadas do medronho.
Apesar do processo ser tradicional, há uma crescente preocupação com a qualidade e a regularidade da produção. Os produtores estão a investir em tecnologias que permitam uma fermentação e destilação mais controladas, sem perder a autenticidade do método artesanal. Atualmente existem na região várias destilarias qualificadas, que garantem essa qualidade.