A tradição da produção de medronho na família de José Simão remonta, pelo menos, ao seu avô. O seu pai, seguindo seus passos, perpetuou essa atividade. Nascido e criado nesta região, José Simão continua esta tradição que remonta, pelo menos, aos tempos da ocupação romana.
Antigamente, esta área da Sertã era dominada por um pinhal denso, o que dificultava o desenvolvimento dos medronheiros, que não frutificavam devido à sombra e à competição por nutrientes. No entanto, os incêndios de 2003 e 2020 alteraram drasticamente a paisagem, eliminando a maior parte da vegetação e abrindo espaço para a regeneração natural dos medronheiros. Hoje, José Simão tem cerca de quatro hectares dedicados exclusivamente a esta cultura, e sente-se satisfeito com a viabilidade económica da produção de medronho.
Aproveitando a ocorrência espontânea dos arbustos na encosta do seu terreno, Simão – tal como outros agricultores da região - incrementa o ordenamento da exploração desenterrando novos arbustos que nascem nas clareiras e transplantando estes para filas promovendo a uniformidade do povoamento. A ordenação em filas permite aumentar a exposição dos arbustos ao sol, essencial para o desenvolvimento e frutificação, e facilita a colheita e a manutenção.
O medronheiro existia naturalmente na região desde sempre e as diversas comunidades mantinham a tradição de colher o medronho maduro para fazer aguardente, numa atividade sazonal que se estendia pelos baldios das serras. Mas recentemente, muito graças ao esforço de técnicos como João Gama e João Dias que sensibilizam as populações para as vantagens da exploração deste arbusto, aumenta a quantidade de agricultores locais que estão a interessar-se pela produção do fruto do medronheiro. Este movimento, realça João Dias, procura transferir os conhecimentos mais recentes da produção frutícola para a cultura desta planta. Para tal torna-se necessário escutar e aprender com os agricultores tradicionais como José Simão que possuem um conhecimento inestimável, pois o medronheiro nunca foi sujeito a uma “domesticação”, possuindo uma diversidade genética que convém não perder.
As plantas cultivadas em viveiro (usadas para povoar rapidamente novas áreas de exploração) geralmente possuem um único tronco principal. Para estimular a ramificação e aumentar a produção, realiza-se a poda de formação, que consiste em cortar o tronco principal para induzir o crescimento de novos brotos. Os incêndios também podem desencadear a brotação de múltiplos ramos a partir da cepa, aumentando a produtividade da planta a longo prazo. A produção de medronho varia significativamente de ano para ano, sendo influenciada por fatores climáticos e pela carga de frutos da temporada anterior. Simão explica que quando a produção é muito elevada, a planta pode entrar em fase de alternância, com menor produção no ano seguinte.
A colheita
Ao mesmo tempo em que colhemos os medronhos maduros, já podemos observar os botões florais que darão origem aos frutos da próxima safra. A floração do medronheiro é um processo gradual, e é comum encontrarmos flores e frutos em diferentes estágios de desenvolvimento na mesma planta. O ciclo de vida do medronho é anual, ou seja, o fruto leva cerca de um ano para amadurecer. A colheita dos medronhos exige cuidado para evitar danos aos frutos e à planta. Os medronhos podem ser colhidos em diferentes estágios de maturação, como explicam Simão e Gama, desde o amarelo até o vermelho intenso. No entanto, os frutos maduros apresentam maior teor de açúcar e aroma característico. João Gama afirma que a partir da observação da prática tradicional, se desenvolveu um método simples que permite o amadurecimento rápido destes frutos amarelos aproveitando uma característica do medronho é um fruto muito climatérico que tendo alguma concentração de amidos e ácidos em quando amarelo, consegue fazer a maturação fora da planta.
Um arbusto resiliente
O medronheiro, com sua capacidade de regeneração e de criar barreiras naturais, revela-se uma espécie chave na prevenção de incêndios florestais. Estudos científicos demonstram que a presença de plantações de medronheiro pode reduzir significativamente a intensidade e a propagação do fogo, contribuindo para a proteção de vidas e bens.
Após um incêndio, o medronheiro, graças à sua capacidade de rebrotar a partir da cepa, costuma levar cerca de quatro anos para produzir frutos novamente. No entanto, a regeneração pode ser mais rápida, como aconteceu em 2020, quando os primeiros frutos surgiram apenas três anos após o incêndio. No entanto, Simão notou que esses frutos tinham baixo teor de açucares talvez, explica, devido ao esforço que o arbusto estava a fazer para recuperar o seu tamanho normal.